
Como pessoas com deficiência auditiva percebem a música? Essa foi a pergunta que guiou a tese de doutorado de Pierangela Nota Simões, aluna do Programa de Pós-Graduação em Saúde da Comunicação Humana da Universidade Tuiuti do Paraná. O trabalho, intitulado “Eu quero é botar meu bloco na rua: a percepção musical de usuários de aparelho de amplificação sonora individual”, foi reconhecido como a melhor tese do programa em 2023 e indicado ao Prêmio Capes de Tese, uma das mais importantes premiações acadêmicas do país.
A pesquisa, desenvolvida ao longo de quatro anos, traz uma abordagem inovadora ao investigar como a música é percebida por pessoas que utilizam aparelhos auditivos. “O objetivo não é testar a pessoa, mas avaliar se o aparelho oferece uma boa condição de percepção musical”, explica Pierangela.
Etapas da pesquisa
O estudo foi dividido em quatro fases: revisão sistemática da literatura, desenvolvimento de um teste específico, validação da ferramenta e aplicação com usuários de aparelhos auditivos.
A primeira etapa envolveu a análise de como a percepção musical é avaliada em diferentes públicos, incluindo usuários de aparelhos auditivos, implantes cocleares e pessoas sem dispositivos de auxílio auditivo. A partir dessa revisão, a equipe criou um teste inédito, com foco na avaliação de elementos como timbre e melodia.
O teste foi elaborado com orientação da professora Dra. Débora Luders e colaboração do professor Guilherme Romanelli, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), especialista em música. A primeira aplicação foi realizada na clínica-escola da Tuiuti, com participação da comunidade, funcionários e docentes da instituição.
Validação em dois formatos
Com a chegada da pandemia de COVID-19, em 2020, a metodologia precisou ser adaptada. A validação do teste foi realizada em duas etapas: presencial, com 51 participantes em Curitiba, e online, com mais de 100 pessoas de diferentes regiões do Brasil.
A divulgação online utilizou a estratégia de “bola de neve”, em que os próprios participantes ajudavam a compartilhar o teste por redes sociais e grupos de WhatsApp. “Conseguimos alcançar participantes de estados como Acre, Rio Grande do Norte e Santa Catarina, o que ampliou muito nosso alcance”, comenta Pierangela.
Resultados com usuários de aparelhos auditivos
Na fase final, o teste foi aplicado em 30 usuários de aparelhos auditivos. Além disso, 14 participantes foram avaliados com e sem o uso dos dispositivos, o que permitiu observar a influência direta dos aparelhos na percepção musical.
A pesquisa destaca que muitos desses dispositivos são projetados prioritariamente para otimizar a audição da fala, deixando em segundo plano outras experiências sonoras, como a música. Nesse contexto, o estudo oferece uma importante contribuição para o desenvolvimento de recursos mais inclusivos.
Impacto social e aplicabilidade
A pesquisa de Pierangela vai além dos dados técnicos: ela busca promover inclusão e qualidade de vida por meio da música. “A música toca todos nós em algum momento da vida. Levar essa experiência a quem perdeu a audição é algo muito significativo”, reflete a doutoranda.
O teste desenvolvido tem potencial de uso por profissionais como fonoaudiólogos, musicoterapeutas e educadores musicais, contribuindo para práticas mais eficazes e sensíveis às necessidades de pessoas com deficiência auditiva.
Reconhecimento nacional
A pesquisa foi indicada à 19ª edição do Prêmio Capes de Tese, um reconhecimento que valoriza as melhores produções científicas de doutorado no Brasil. “Ser indicada ao Prêmio Capes já é uma grande conquista. Me sinto muito honrada”, afirma Pierangela.
O trabalho reflete o compromisso da Universidade Tuiuti com a promoção humana e a produção de conhecimento com impacto real na sociedade.